O estado de saúde de qualquer pessoa está diretamente relacionado com o desenvolvimento dos órgãos dos sentidos e a expressão dos sentidos como receptores da alma e da mente. É através dos sentidos que a percepção do meio, de si e do outro, se estabelece. E é através deles que aprendemos sobre relação, sobre limites e trocas.
Os estudos que fundamentam a Antroposofia consideram que existem 12 sentidos importantes para a constituição física e anímica do ser humano. Além dos cinco sentidos básicos (visão, audição, olfato, tato e paladar), considera também o sentido de equilíbrio, o vital, o térmico, o movimento, o pensamento, a palavra e o sentido do eu. Todos os 12 sentidos atuam em conjunto e influem diretamente no corpo físico, em sua vitalidade e na formação e relação entre diversos órgãos. Atuam também na vivência e expressão das sensações e emoções (Steiner, 1997).
Para entendermos melhor esta relação integrada dos sentidos e órgãos sensórios, faremos um recorte no sentido da audição. Captados pelo ouvido, os impulsos sonoros do ambiente são encaminhados ao cérebro estimulando o desenvolvimento da cognição, memória e aprendizagem. Este é um processo chamado percepção auditiva, importante para distinguirmos sonoridade (graves e agudos), timbre (tipo de voz ou de instrumento musical), despertando outras percepções, como a espacialidade, que localiza e reconhece de quais direções chegam os sons.
O ouvido também é responsável pelo equilíbrio do ser humano. Observando a anatomia interna, encontramos cristais de carbonato de cálcio que se movimentam em um líquido cheio de cílios sensíveis, os quais percebem qual a posição em que o corpo se encontra em relação a gravidade. (Schoorel, 2013). Ao movimentarmos, essa força gravitacional atrai estes cristais que tocam nas células sensoriais e produzem impulsos nervosos que são enviados ao cérebro.
O ouvido atua diretamente no desenvolvimento dos órgãos da fala e possui grande importância para a atuação da voz, pois trabalha em unidade com a laringe. É evidente também a dificuldade de cantar para quem não consegue ouvir bem (Kolisko, 2011). Outro fato importante que podemos destacar é que a criança aprende por imitação, e um comprometimento na audição irá limitar o seu processo de aprendizagem com a linguagem oral causando, posteriormente, comprometimento na comunicação.
Como explica Kolisko, a laringe se relaciona com todo o sistema de membros do corpo humano e seguindo este pensamento da ciência antroposófica, podemos imaginar que ao ouvir uma música, por exemplo, estaremos agindo em todos os corpos: físico, anímico e espiritual. (Kolisco, 2011).
Segundo Schoorel os órgãos dos sentidos precisam ser cuidados e estimulados após o nascimento, para que se desenvolvam plenamente (Schoorel, 2013). Quando algum órgão do sentido apresenta um funcionamento atípico, a forma como este sentido se expressa vai influenciar a relação entre todos os sentidos e a manifestação física e anímica deste indivíduo no mundo. Sabemos que pessoas cegas apresentam sensibilidade extrema na percepção relacionada aos sentidos de tato, olfato e propriocepção. Em seu desenvolvimento, uma criança com surdez apresentará outras formas de relacionar-se com o mundo, mas invariavelmente apresentará dificuldade em expressar-se através da fala e do canto.
A respiração e a voz são a base para os exercícios terapêuticos higiênicos e profiláticos utilizados na cantoterapia antroposófica, trabalhando estruturas importantes para a saúde. Nesta prática realiza-se uma sequência de fonemas combinados com movimentos corporais, imaginação e elementos musicais (melodias, intervalos, harmonia e ritmo) específicos para cada indivíduo ou grupo. A cantoterapia antroposófica é uma terapia fundamentada na Escola do Desvendar da Voz, criada pela cantora sueca Valborg Werbeck Svardstrom (1879- 1972).
Ao cantarmos, atuamos diretamente nos órgãos sensórios como a laringe e o ouvido, além de experimentarmos o fluxo da corrente sonora que percorre todo nosso corpo através da respiração. O respirar permite a troca consigo, com o ambiente e com o outro, nos traz expansão e contração, e nos proporciona equilíbrio entre os sistemas neurossensorial (pensar), rítmico (sentir) e metabólico motor (querer).
Esta arte musical possibilita o desenvolver do aparelho auditivo-fonador, expandindo a escuta, externa e interna, e a percepção de si. Age nas forças formativas e no sistema rítmico, permitindo e desenvolvendo os potenciais físicos, mentais, emocionais e sociais, revigorando e trazendo ordem para o ser humano através da música (CAVALCANTI, 2002).
O cantar possibilita o expressar da voz e do corpo que vem revelar e despertar emoções, sentimentos e memórias adormecidos. É uma terapia para a alma que promove soltura e liberta os processos de endurecimento e tristezas, proporcionando autoconfiança, autoconhecimento e alinhamento entre o ouvir, o sentir e o falar.
REFERÊNCIAS:
CAVALCANTI, Francisca Maria Barbosa. Musicoterapia e terapêutica antroposófica: processo interativo com o canto Werbeck. Pós-Graduação-Especialização em Musicoterapia. Universidade do Sul de Santa Catarina-UNISUL, Florianópolis, 2002.
KOLISKO, Eugen. Cantoterapia: 8 palestras de Eugen Kolisko. Org.Regina Arena e Francisca Cavalcanti. Trad. Joaquim José de Assis. Florianópolis, Escola Raphael de Canto e Cantoterapia, 2011.
SCHOOREL, Edmond. Os primeiros sete anos: fisiologia da infância. São Paulo: Antroposófica, 2013.
STEINER, Rudolf. Os doze sentidos e os sete processos vitais: conferência proferida em Dornach (Suiça) em 12 de agosto de 1916. Antroposófica, 1997.
TABAQUIM, Maria de Lourdes. et al. Avaliação do desenvolvimento cognitivo e afetivosocial de crianças com perda auditiva. Revista CEFAC, v. 15, p. 1475-1481, 2013.
WERBECK-SVÄRDSTRÖM, Valborg. A escola do desvendar da voz: um caminho para a redenção na arte do canto. Antroposófica, 2001.
Massoterapeuta Ayurvédica, formada pelo Califórnia College os Ayurveda, Colômbia
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